Headhunters, pesquisas e um teste feito pela VOCÊ S/A mostram que aparência é essencial na entrevista de emprego
Aparência importa, sim
Teste exclusivo feito por VOCÊ S/A confirma:
quem se veste mal não ganha nem a chance de mostrar sua competência
Por Daniela Diniz
Sabrina Carbone, executiva de marketing, entre as duas produções escolhidas para o teste: detalhes como cor e tecido fazem toda a diferença na aparência
Dois segundos. O tempo que você leva para dizer bom-dia a um headhunter é exatamente o tempo de que ele precisa para formar a primeira impressão sobre você. Os dados são de uma pesquisa da Universidade Harvard e, no mundo dos negócios, podem ser traduzidos assim: sua aparência é tão importante quanto a sua formação e experiência profissional. Se o visual não agradar, pode dizer adeus àquele cargo que você tanto deseja. Porque ele jamais será seu. Numa entrevista de emprego, não tem currículo, plano de carreira e referência profissional que resistam à má impressão provocada por um terno de segunda, um decote exagerado ou uma maquiagem carregada. Num primeiro olhar, são esses pecados que grudam no subconsciente da pessoa que está lhe avaliando. E é praticamente impossível conseguir arrancá-los de lá. Foi exatamente isso o que mostrou um teste feito com exclusividade para esta reportagem, para verificar até que ponto o visual interfere na contratação.
A pedido da VOCÊ S/A, dois executivos paulistas passaram pela avaliação de quatro recrutadores (dois homens e duas mulheres): Sabrina Carbone, de 35 anos, executiva de marketing com especialização na Universidade da Califórnia-Santa Bárbara, e Emerson Walter dos Santos, de 29 anos, executivo de marketing com MBA Executivo pelo Ibmec. Os headhunters analisaram currículo, aparência, experiência, comunicação e adequação a uma vaga fictícia, criada por nossa equipe. Nas duas primeiras ocasiões, os dois usavam roupas, sapatos e acessórios inadequados para uma entrevista de emprego. Nas outras, estavam cuidadosamente vestidos e maquiados, seguindo as orientações da consultora de imagem Ilana Berenholc (veja as fotos ao longo da matéria e uma entrevista com Ilana). O resultado deixou todo mundo de queixo caído. Com o mesmo currículo e a mesma experiência profissional, os dois arrancaram elogios de uma das duplas de headhunters e várias críticas da outra. A única diferença de uma entrevista para a outra era exatamente a aparência.
Erros Ele:
OLHEIRAS Ar de cansado
CAMISA amarela com textura e colarinho mole
GRAVATA de poliéster, dura, com nó pequeno
PRENDEDOR DE GRAVATA nunca deve ser usado
BOTÕES Todos os botões do terno fechados
TECIDO DO TERNO sintético, com padronagem chamativa
PASTA de modelo antigo em cor destoante
CALÇA muito comprida
SAPATO mocassim marrom com solado
Erros Ela:
CABELOS volumosos
MAQUIAGEM carregada e brilhante (sombra combinando com a cor do terno)
BIJUTERIAS Brincos grandes e de strass, assim como o anel e a pulseira
DECOTE exagerado
TERNO claro, em cor inapropriada para entrevistas
CALÇA justa e curta
BOLSA com grandes argolas prateadas
SANDALIA muito alta, com dedos à mostra
Para começo de conversa, numa das empresas Sabrina não ganhou nem cafezinho quando estava mal produzida. No quesito aparência, ela foi criticada pelo decote profundo, pelo terno justo e de cor clara, pelos acessórios brilhantes e pela maquiagem pesada. Os dois headhunters que a avaliaram nessa versão não ficaram impressionados com seu currículo, nem se deram ao trabalho de conversar com ela em inglês, procedimento rotineiro numa seleção desse porte. Ambos foram taxativos: não encaminhariam a executiva para nenhuma das empresas que atendem. "Parecia que ela ia para uma festa e não para uma entrevista de emprego", disse um deles. Com Emerson, o desastre se repetiu. Quando foi indagado sobre o visual do profissional, um dos headhunters disparou uma metralhadora contra o executivo. "Ele estava malvestido e com ar de cansado. Dava para perceber que o terno era novo, mas inadequado para a ocasião e para o próprio profissional. Vestia mal e ficava ainda pior com a camisa de tom amarelo-claro e o prendedor de gravata! Sem falar naquela pasta horrível e no sapato com solado de borracha." Resultado: desclassificado.
Um dia depois, Emerson e Sabrina foram entrevistados por dois outros headhunters. Ela usava terninho preto de uma conceituada grife brasileira, escarpim preto de salto médio, acessórios e maquiagem discretos, cabelo na escova. Ao vê-la entrar, um dos recrutadores disse que ficou convencido de que ela justificaria um salário de 15 000 reais, mesmo antes de entrevistá-la. Outro revelou que, apenas com o currículo em mãos, não tinha ficado muito curioso para conhecê-la. "Mas, quando a vi, pensei: 'Ela vai ter uma boa justificativa para sua vivência profissional e deve ter boas histórias para contar'." Emerson não deixou por menos. Vestiu terno cinza-escuro, camisa branca, gravata de seda e sapatos pretos de amarrar. Transmitiu tanta credibilidade que um dos headhunters perguntou se podia ficar com seus contatos para o caso de surgir uma vaga de verdade, em uma das empresas com que trabalha. Tanto ele como Sabrina disseram que, quando estavam clássicos e elegantes, conseguiram o dobro do tempo nas entrevistas e passaram pelo teste da conversa em inglês. "Me senti muito mais valorizada. Quando estava malvestida, a entrevista mais parecia um check-list", diz Sabrina.
Acertos Ele:
CAMISA branca
GRAVATA de seda com listras diagonais e nó Windsor (clássico)
BOTÕES Último botão do terno aberto
TERNO de cor escura, de tecido adequado: lã fria com padronagem discreta BAINHA na medida certa
SAPATO preto de amarrar
Ele usa terno e camisa Crawford, sapato Shoestock e gravata VR
Acertos Ela:
CABELOS com escova
MAQUIAGEM discreta em tons de marrom
CAMISA branca sem expor o colo
TERNO clássico e escuro,com detalhes sutis
ANEL Discreta peça de designer: toque de personalidade sem perder a classe
BOLSA média, preta e discreta
BAINHA na medida certa
SCARPIM preto com salto médio
Ela usa terno Lita Mortari, camisa Siberian, sapato Arezzo,
bolsa e anel do acervo pessoal de Ilana Berenholc.
OS FEIOS QUE ME DESCULPEM...
O teste é uma mostra do que acontece diariamente nos processos seletivos realizados Brasil afora. VOCÊ S/A ouviu alguns dos principais headhunters do país sobre a questão da aparência. E o que eles revelaram não é muito diferente do que Emerson e Sabrina sentiram na pele. "A primeira impressão conta muitos pontos na seleção", diz Renata Filippi Lindkuist, headhunter da Mariaca & Associates, consultoria de recrutamento e aconselhamento de carreira, em São Paulo. "O executivo feio, baixo, fora dos padrões básicos de beleza precisa estar impecavelmente vestido para ganhar mais tempo na entrevista e provar sua competência. "Em contrapartida, os bonitos já são recebidos com bônus. "Você não espera alguém lindo na sua sala. Mas espera alguém adequado para uma entrevista", afirma Carlos Diz, sócio do Instituto de Liderança Executiva, no Rio de Janeiro, e ex-sócio da SpencerStuart, uma das maiores empresas de recrutamento do mundo. "Estar bem vestido nessa hora faz muita diferença, pois você mostra para o entrevistador que está preocupado com a imagem que está passando", explica.
A preocupação dos headhunters com a aparência dos candidatos é tanta que rendeu um capítulo inteiro do livro Como Conquistar Uma Ótima Posição de Gerente ou Executivo... E Dar Um Salto Importante em Sua Vida Profissional (Editora M. Books), da consultora Sharon Voros, recém-lançado no Brasil. Num dos trechos, a autora descreve o comportamento dos headhunters norte-americanos antes de conhecer um profissional. "Alguns dos momentos mais tensos acontecem no aeroporto, onde os recrutadores costumam marcar reuniões com os candidatos", escreve Sharon. Quando os passageiros desembarcam, todo headhunter torce para que o seu candidato seja alto, bonito e muito elegante. Exatamente como no Brasil. Alguns dos recrutadores entrevistados para esta reportagem dizem fazer até apostas sobre o candidato que seus clientes vão escolher. "Nem sempre é o melhor", diz uma ex-headhunter paulista, com 15 anos de experiência em seleção de altos executivos. Ela conta que uma vez apresentou cinco profissionais para um cliente. A seleção estava na etapa final, o que significa que todos eles apresentavam um ótimo padrão de competência e adequação ao cargo. "Um deles tinha o melhor perfil. E nós sabíamos disso. Mas sabíamos também que ele não seria o escolhido, pois tinha uma grande cicatriz no rosto", lembra. "Entre os cinco, havia um que, além de competente, era muito bonito. Sem dúvida, ele foi o escolhido."
Outro experiente headhunter conta que, uma vez, ficou muito impressionado com o currículo de uma candidata. Ao entrevistá-la por telefone, sentiu a mesma energia positiva. No dia da entrevista pessoal, porém, veio a grande decepção. "Ela estava preparada para sair à noite e não para uma entrevista", lembra. "A roupa era justa e tinha um decote muito exagerado. Apesar de excelente, não poderia apresentá-la para meu cliente." Sim, eles prestam atenção em todos os detalhes. Todos mesmo. Antes de apresentar um ótimo candidato ao cliente, uma consultora paulista preocupou-se em avisar o representante da empresa: o profissional tinha um furo na orelha. Não usava brinco, mas tinha um furinho comprometedor. "O cliente disse que não havia problema e que o candidato era muito bom. Mas que não iria contratá-lo porque não havia a tal química entre eles. Entendi muito bem o que isso significava", diz ela.
BONITOS E RICOS
Uma boa aparência não garante apenas uma vantagem competitiva numa seleção de emprego. Profissionais considerados bonitos e elegantes também costumam ganhar mais e conquistar as melhores posições. Estudo conduzido pelos economistas americanos Daniel Hamermesh e Jeff Biddle avaliou o impacto da aparência nos ganhos dos executivos. A pesquisa mostrou que quem estava abaixo do padrão de beleza recebia 9% a menos por hora e quem estava acima do padrão ganhava 5% a mais. O economista sênior do Federal Reserval de Saint Louis (uma das unidades do banco central norte-americano) Michael Owyang, aprofundou um pouco mais a questão. Segundo ele, as diferenças entre os salários dos mais bonitos e mais feios são resultados de uma queda na produtividade dos menos favorecidos. A explicação de Owyang é que quanto mais bonita for a pessoa, mais confiante e confortável ela se sente e, portanto, mais produtiva ela é.
Economistas parecem adorar essa questão. Nicola Persico, Andrew Postlewaite e Dan Silverman, das universidades da Pensilvânia e Michigan, nos Estados Unidos, realizaram um estudo sobre a relação entre os salários e a altura dos executivos. A partir de análises com americanos brancos, chegaram à conclusão de que cada 1,8 ponto percentual acrescentado ao salário correspondia a 1 polegada a mais na altura. Uma pesquisa do jornalista norte-americano Malcolm Gladwell, autor de Blink -- The Power of Thinking Without Thinking (Ed. Hardcover), com os CEOs das 500 maiores empresas americanas listadas na revista Fortune parece comprovar a teoria. Na totalidade, os CEOs são aproximadamente 3 polegadas (cerca de 7,5 centímetros) mais altos do que a média do homem americano.
PRECONCEITO?
Você pode estar pensando que as histórias acima refletem sobretudo o preconceito que reina no meio corporativo. É verdade. Há, sim, um estereótipo a ser preenchido quando se está à caça de executivos. E isso pode ser uma tacada perigosa no jogo da contratação. "O preconceito existe, sim. É natural do ser humano. Se você acha uma pessoa interessante, há uma predisposição para encontrar pontos positivos nela", diz o psicólogo Moacir Carlos Silva, do Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo, especializado em comportamento organizacional. "É muito importante que o headhunter se cerque de outros dados objetivos, para não comprar uma fraude", afirma.
Os recrutadores concordam e procuram ressaltar que o que está em jogo não é apenas a aparência. Ela conta muito, mas está longe de ser o único fator avaliado. "Beleza abre portas, mas isso não significa que a pessoa vai tê-las sempre abertas", afirma o consultor Carlos Diz, do Instituto de Liderança Executiva. "Para isso, você precisa provar sua competência, habilidade política e jogo de cintura no dia-a-dia. " A questão é: fica mais fácil provar que você tem conteúdo quando tem uma aparência nota 10. "Quando nivelamos candidatos em termos de competência e perfil, é claro que há um favorecimento para os mais bonitos", afirma Sofia Esteves do Amaral, da DM Recursos Humanos, em São Paulo. "Mas estamos falando de candidatos com o mesmo nível de currículo e experiência profissional", esclarece. Ou seja, nem pense em torrar as economias do MBA no próximo shopping. Você pode deixar todo mundo morrendo de inveja da sua produção, mas é claro que não vai ser contratado só por causa disso. E tem mais. De nada adianta gastar uma bolada se você não souber exatamente o que é que os recrutadores consideram um visual competente. Há uma série de regrinhas para o guarda-roupa corporativo, que incluem desde a cor da camisa até o tecido do terno. O que parece lindo para você às vezes é uma heresia para os headhunters.
Fonte: Revista Você S.A, edição 89, nov/2005